José Renato Sátiro Santiago Júnior — Foto: Arquivo Pessoal

Por Beatriz Carvalho e Thaís Jorge — Fortaleza, CE

Quando José Renato Sátiro Santiago Júnior era criança, a viagem de férias certa era para Fortaleza, para o lugar preferido: o quintal na casa dos avós. A brincadeira de jogar bola com os primos ganhava um tom especial quando o neto do meio ia até o gancho onde ficava pendurada a rede do avô e pegava a chave que abria os portões do estádio.

O avô Felipe Santiago, marido de Noelzinda, era um apaixonado por futebol e construiu um campo para que o “Às de Ouro” pudesse treinar. A equipe depois passou a se chamar Floresta Esporte ClubeEm 2021, o time conseguiu o inédito acesso à Série C do Campeonato Brasileiro.

– Desde moleque, chegava a Fortaleza e tinha um estádio no quintal dos meus avós. Ali era um terreno grande, onde as pessoas jogavam futebol. O time mudou para Floresta porque minha avó dizia que aquilo ali parecia uma floresta, tinha muitas árvores – contou José Renato, ao ge.

O time fundado em 9 de novembro de 1954 treinava nos campos no quintal da casa de Felipe. Era comum ver os meninos batendo uma bolinha no fim de tarde, entre um jogo e outro.

Estádio Municipal Manuel Sátiro — Foto: Arquivo Pessoal

Estádio Municipal Manuel Sátiro — Foto: Arquivo Pessoal

Com a reforma do estádio Presidente Vargas, o lugar herdou as antigas arquibancadas da praça esportiva, doadas pela prefeitura de Fortaleza. Assim, o sítio Floresta, às margens da lagoa do Mondubim, transformou-se no estádio Manoel Sátiro, em 21 de abril de 1965.

– Meu avô cercou o terreno com as arquibancadas, que eram de concreto armado, e pagou da aposentadoria dele para murar o campo e criar o estádio. O nome era uma homenagem ao pai da minha avó – explicou José Renato.

Roberto Sátiro, Felipe Santiago e José Renato Sátiro — Foto: Arquivo Pessoal

Roberto Sátiro, Felipe Santiago e José Renato Sátiro — Foto: Arquivo Pessoal

A camisa amarela

Com o time montado, restava o uniforme para o Floresta entrar em campo. Felipe Santiago viajou até São Paulo para comprar as camisas para o time do coração. O plano era que fosse verde e branco, mas tudo mudou ao ver as amarelinhas estendidas. O Floresta se vestiria como o Brasil.

– Em 1954, a Seleção começou a jogar de amarelo, porque em 1950 o Brasil perdeu a Copa. Meu avô comprava as camisas em São Paulo. Não tinha lojas esportivas no Ceará, e eles compravam camisas de times que já existiam. O meu avô comprou a da Seleção Brasileira. O Floresta foi o primeiro time a jogar de camisa amarela – disse.
Elenco do time amador do Floresta com primeiro uniforme da equipe — Foto: Arquivo Pessoal

Elenco do time amador do Floresta com primeiro uniforme da equipe — Foto: Arquivo Pessoal

Foi também com o contato com o avô, o time e o futebol que nasceu outra paixão de José Renato: colecionar.

 Desde moleque, o Floresta é meu avô. Ele tinha uma coleção de jornais que colocava do lado da rede dele, onde guardava todas as notícias do Floresta. Quando eu ia de férias, tinha acesso a esses jornais. Meu acervo começou com eles.

Hoje com 50 anos, o neto do fundador tem o maior acervo de livros de futebol do mundo, com quatro mil e 500 exemplares e 25 mil itens. Além disso, escreve sobre o esporte e se preocupa em manter viva a história do time que andou muito até chegar à Série C do Campeonato Brasileiro.

– A história do clube, sem falsa modéstia, é muito fruto dos valores que foram perpetuados pelo meu avô e pela minha avó. O Floresta não é só o clube que está na Série C, tem uma história rica e valorosa. É uma uma longa história, é um time tradicional, de 1954, não nasceu em 2014. Muitos nomes do futebol cearense saíram do Floresta.

O caminho até a Série C

Felipe Santiago faleceu em 1 de junho de 1987, e o estádio ficou sob os cuidados de um dos filhos, Silvio Sátiro. Depois da partida de Noelzinha, em 1996, o familiares passaram a frequentar menos o lugar.

– Os primos não se encontravam mais. Foi natural que se esvaziasse. O Floresta começou a ser cuidado por quem morava perto, a estrutura sempre ficou disponível. A família acabou se afastando mais do futebol, invadiram o terreno e houve o interesse do Teixeira.

Em 2014, o empresário Sérgio Teixeira fez uma proposta pela compra do terreno e do clube. Roberto Sátiro aceitou. O time, até então era tradicional no futebol amador, ganhou forças para se profissionalizar. Passou, então, a se vestir em verde e branco, como o desejo do primeiro dono. A folha salarial é R$ 400 mil mensais para comissão técnica, elenco e funcionários do CT.

As mangueiras e pés de sapoti deram lugar aos campos para treinos. O terreno de 65 mil m² ganhou um prédio-sede, alojamentos, três campos oficiais, dois soçaites, academia e vestiários. O espaço é referência no estado e já foi utilizado para a preparação de equipes visitantes na disputa da Série A, como o Cruzeiro em 2019.

– É uma estrutura que dá condições com campos, fisiologia, tem profissionais capacitados em todas as áreas e facilita o bom trabalho. Depois do acesso, há uma necessidade de melhora natural. Afinal, a exigência aumenta, mas o clube está mobilizado em melhorar ainda mais as condições para que tenha um legado desse acesso – projetou Leston Júnior, treinador do Floresta na campanha da Série D.

Terreno Vila Manoel Sátiro — Foto: Divulgação

Terreno Vila Manoel Sátiro — Foto: Divulgação

Queda no estadual, acesso na Série D

O time disputou a terceira divisão do Campeonato Cearense em 2015 e alcançou de imediato o acesso à Série B do estadual como vice-campeão. Após dois anos, conseguiu novamente a vice-liderança do campeonato com uma grande campanha e chegou à elite do Cearense. Além disso, fez história vencendo o Fortaleza na final da Taça Fares Lopes e garantindo a vaga na Copa do Brasil 2018.

Na competição nacional, o Floresta lutou até o fim, mas foi derrotado por 2 a 0 pelo Botafogo-PB e se despediu ainda na primeira fase. Em 2019, não conseguiu o acesso para Série C do Brasileiro após perder para o Jacuipense nas quartas de final.

O primeiro semestre de 2020 também guardou notícias amargas para o Verdão, que terminou a Série A do Campeonato Cearense na penúltima posição e foi rebaixado.

Para a Série D, o Floresta se reformulou: buscou reforços, apostou em um novo treinador que já acumulava dois acessos no currículo e atingiu a meta após vencer a primeira partida contra o América-RN por 2 a 0 e empatar a segunda em 1 a 1. Não há nenhum grande nome conhecido de modo nacional. O goleiro Douglas e o atacante Núbio Flávio são os maiores destaques.

– Foi uma temporada com o início ruim, cheguei após o campeonato estadual, mas que enfim termina com o acesso. O clube cometeu alguns erros no início, e por conta disso acabou sendo rebaixado no estadual. Mas teve humildade de buscar um caminho diferente, para que pudesse, depois de muito trabalho e planejamento, conseguir o acesso à Série C – explicou Leston Júnior.

Treino Floresta, Leston Júnior — Foto: Ronaldo Oliveira/Floresta EC

Treino Floresta, Leston Júnior — Foto: Ronaldo Oliveira/Floresta EC

– Viemos com o intuito de dar a volta por cima e realizar conquistas. Queremos a Fares Lopes que estamos disputando e o título da Série D. O Leston tem total mérito do que fez nesses meses de treinamento, implantou uma forma de jogar e colocamos em prática, buscamos seguir fazendo esse trabalho e evoluir – disse Flávio Torres, jogador do Floresta.

Jogadores do Floresta comemoram acesso à Série C — Foto: Lucas Catrib/SVM

Jogadores do Floresta comemoram acesso à Série C — Foto: Lucas Catrib/SVM

Agora o caminho leva ao prêmio máximo, a conquista do título da Série D do Campeonato Brasileiro. E as histórias de José Renato, Felipe, Noelzinha, toda a família Sátiro Santiago, Sérgio Teixeira, Leston Júnior e tantos atletas levam à decisão deste sábado, no estádio Jorge Ismael de Biasi, às 18 horas, contra o Novorizontino, no interior de São Paulo.

No primeiro jogo, em Fortaleza, houve empate por 1 a 1. Quem vencer, garante a passagem para a final contra Mirassol-SP ou Altos-PI (os paulistas golearam por 4 a 0 no primeiro duelo).

– A expectativa é grande, já passamos parte da decisão em um jogo equilibrado e acredito que não vai ser diferente esse jogo da volta. Temos que estar concentrados para fazer um jogo forte e jogar dentro das nossas características, mas está aberta essa decisão. Tomara que a gente tenha felicidade e competência para nesses 90 minutos para seguir sonhando com o título – disse Leston.

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